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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Empresas devem tratar alcoolistas : Justiça condena companhias que demitiram funcionários com vício.

Por diversas vezes, o vigilante Roberto Paulo, 47, foi trabalhar bêbado. Os colegas e supervisores o advertiam. O profissional era mandado de volta para casa, e o dia não trabalhado era descontado de seu salário. Como o problema se repetiu, foi demitido por justa causa.


A demissão por embriaguez habitual ou em serviço, apesar de estar prevista na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) como justa causa, tem sido condenada pelas decisões do TST (Tribunal Superior do Trabalho) .


Isso porque a dependência do álcool é reconhecida como doença pela OMS (Organização Mundial da Saúde). A recomendação é que o trabalhador seja afastado da empresa para tratamento, esclarece o presidente do TST, Milton de Moura França."Se o funcionário é doente, tem as faculdades comprometidas, o que faz dele quase um "inimputável" [que não pode ser acusado ou penalizado] no trabalho."


Em 2008, oito anos após ter sido demitido, Roberto Paulo, que diz estar sem beber há dez anos, recebeu cerca de R$ 25 mil de indenização da empresa, à qual afirma ter pedido tratamento para o alcoolismo.

Luta por reparação na Justiça é lenta : Casos têm que ser julgados em instâncias superiores para que trabalhador seja indenizado após demissão


Por ser uma interpretação da lei, a jurisprudência que se forma com as decisões mais recentes do TST -de que o trabalhador alcoolista não pode ser demitido por justa causa- não obriga os tribunais de primeira e segunda instâncias a adotar as mesmas argumentações.

Na prática, o processo que o funcionário demitido move contra a empresa pode ter de chegar até instâncias superiores para que seja dada decisão favorável ao trabalhador, fazendo com que a sentença leve anos para sair.


Após sete anos, a família do técnico-eletricista Rubens Mohr recebeu indenização da Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária). O profissional havia sido demitido em 2003 por trabalhar alcoolizado.Com o desemprego aliado ao vício, Mohr entrou em grave depressão e enforcou-se seis meses após a dispensa.


No último dia 4 de fevereiro, o TST decidiu que a empresa deveria pagar R$ 200 mil à família de Mohr. A filha do técnico-eletricista, Thays, 22, que à época tinha 14 anos, diz lembrar-se de ver a doença de seu pai piorar e de uma tentativa de internação após a demissão, que não pôde durar o tempo necessário por falta de dinheiro para o tratamento.



A indenização servirá, afirma ela, para pagar os estudos do irmão mais novo, que ingressará este ano no curso de engenharia elétrica em uma faculdade particular. A Infraero afirma que recorreu da decisão e que realiza campanhas de prevenção à dependência química.



Não alcoolistas que bebem em serviço podem ser dispensados



A diferenciação entre o alcoolista e a pessoa que "exagerou na dose" deve ser feita por médicos e psiquiatras. No segundo caso, a demissão pode ser feita por justa causa.



Pelo entendimento do TST, a empresa que oferecer tratamento também tem o direito de demitir o funcionário que se negar a participar do programa ou que voltar a apresentar os mesmos problemas após o auxílio.


Foi o que aconteceu com Arnaldo (que não quis se identificar), 45. O profissional trabalhou em uma empresa de transporte público por 15 anos antes de ser demitido por causa do vício."Me mandaram para clínicas, mas foi difícil entender por que queriam tirar o que eu mais amava -a cachaça", diz ele, que trabalha no Alcoólicos Anônimos e diz estar sem beber há dez anos.



Chefe deve identificar dependente: Faltas e queda de rendimento ajudam a reconhecer profissional que enfrenta o alcoolismo


Para não demitir funcionários doentes, empresas investem em tratamento.A recuperação de um funcionário é mais barata do que a demissão, a contratação e o treinamento de um novo empregado, segundo especialistas consultados pela Folha.


Sentir o cheiro de álcool e notar que o colega de trabalho está bêbado é fácil, mas identificar o dependente é tarefa para supervisores."A pessoa que conseguirá identificar o problema é o supervisor imediato do funcionário, que vai passar tarefas e ver que ele não está conseguindo cumpri-las, atrasando-se e faltando ao serviço", diz o psiquiatra Arthur Guerra, coordenador do grupo de álcool e drogas do Hospital das Clínicas de São Paulo.


Guerra orienta o chefe a acompanhar e anotar as falhas do funcionário. Elas devem ser apresentadas ao setor de recursos humanos, que deverá abordar o trabalhador e oferecer tratamento.Além de chefes e supervisores, a família é um dos grandes aliados das empresas na hora de alertar sobre um funcionário alcoolista.


Na Goodyear, a gerente de recursos humanos Camila Mendes afirma receber telefonemas e visitas de pessoas da família que buscam ajuda para o funcionário.Foi o que aconteceu com Barbosa (que não quis fornecer o primeiro nome), 51, cuja mulher foi à Goodyear pedir que o marido fosse demitido. A ideia era que ele recebesse a rescisão do contrato para que pudessem se separar.


Na hora, a responsável pela área de recuperação de dependentes chamou o funcionário e ofereceu tratamento."Fiquei chorando e comecei a pensar na minha família, na minha filha, que dizia ter nojo de mim, e aceitei ir para a clínica buscar ajuda." Barbosa e a mulher continuam casados. "[Minha filha] diz que sou o melhor pai do mundo", conta ele, que ministra palestras motivacionais em escolas e empresas.


Família



A empresa deve oferecer, além de tratamento ao dependente, auxílio à família, na avaliação de Elza Maio, coordenadora de responsabilidade social da Avon."Quando encaminhamos o funcionário para a clínica, a família é chamada e entende que também está doente e precisa se tratar", destaca.


Tanto a Avon quanto a Goodyear custeiam a primeira internação e oferecem psiquiatras e psicólogos para a família e o funcionário.Se o empregado voltar a beber, terá de pagar o tratamento e poderá ser demitido se tiver quedas no rendimento, comum entre viciados, dizem especialistas.



Frases:


"Depois que entrei na empresa e passei a receber salário, comecei a beber mais. Minha filha não tinha caderno nem uniforme para ir à escola porque eu gastava todo o dinheiro comigo"

BARBOSA, 51 -funcionário da Goodyear


"Eu visitei meu pai internado em uma clínica. Foi uma das poucas vezes que eu me lembro de vê-lo bem, animado e sem álcool por alguns dias" - THAYS, 22 filha de Rubens Mohr



Abordagem tem de apontar baixo desempenho do trabalhador



A empresa não deve apontar a bebida como o problema do dependente de álcool. A recomendação de especialistas é que sejam apresentados os efeitos do vício no desempenho do funcionário.



A queda no rendimento, os atrasos e as faltas devem servir para mostrar que algo afeta a vida profissional."É a doença da negação. Não adianta falar que ele está bebendo demais", indica Wello (que não quis se identificar), do segmento de empresas do Alcoólicos Anônimos de São Paulo.



Para ele, um dos maiores problemas enfrentados na procura do tratamento é que os colegas acobertam o funcionário alcoolista. A psicóloga Sabrina Ferroli, da consultoria de gestão de pessoas Karana, afirma que a equipe protege o alcoolista porque o vício é visto como algo a ser escondido."O chefe compreende que o momento é delicado e acaba sendo conivente", considera a psicóloga.


A melhor maneira de fazer a abordagem é, depois de apontar o problema, "mostrar pontos positivos do trabalho dele e que empresa está disposta a investir nele com tratamento", diz Rosana Lino, coordenadora de recursos humanos da Goodyear. Os grupos de apoio, como o Alcoólicos Anônimos podem oferecer palestras. Dessa forma, os funcionários ganham abertura da empresa para procurar o RH e participar do programa.





Fonte: Folha de São Paulo, 12.02.2011
Site:http://www.granadeiro.adv.br

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